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segunda-feira, 29 de outubro de 2012

ME DEIXA MORRER...


Uma pessoa que me conhecia muito bem disse uma vez para meus "outros pais" que quando eu ficava triste eu precisava ir para estar com eles.
Desta vez eu precisava estar com eles, mas para o funeral dele, que vinha sofrendo as sequelas de um derrame sério. Ele, uma pessoa extremamente ativa para os seus oitenta e dois anos vinha sofrendo muito com a dependência total de outras pessoas para tudo.

Eu nunca ouvi dele, porque nunca me disse isso, mas disse para muitas pessoas e muitas vezes que queria morrer. Estava cansado daquilo tudo. Faziam poucos dias que eu tinha pensado nisso e cheguei a pensar que se desse a ele um placebo qualquer dizendo que era aquilo que ele deveria tomar se quisesse morrer, se ele tomaria.

Pensei na situação em que ele se encontrava várias vezes e é outra dessas situações que eu penso insuportáveis, mas ele passou por muitas outras que eu não sei se sobreviveria a elas.

Sempre achei que uma das coisas mais anti-naturais da vida é perder um filho. Sempre imaginamos que devemos ir primeiro que os nossos e ele perdeu uma filha e um filho com um espaço de anos entre um e outro. Anos mais tarde outra filha sofreu um acidente de carro, com outras quatro pessoas, uma delas, o genro, onde apenas ela sobreviveu e quando eu vi o carro, antes de chegar ao hospital, fiquei muito assustado, achando que deveríamos nos preparar para notícias não muito boas.

Há dois anos, no mesmo mês de outubro uma jovem neta querida se suicidou e isso o fez chorar muito pelos cantos. Isso o afetou muito. O derrame veio meses depois e muitas vezes tivemos dúvidas se sobreviveria à doença.
Sobreviveu e depois de meses de internação e com um lado do corpo paralisado, veio para casa e vinha tendo uma recuperação muito lenta, que não sabemos até onde iria. Ele estava cansado daquilo tudo e se tornou um doente muito irritado com aquela dependência dos outros para tudo.

A amizade que começou pelo fato de termos propriedades de fim de semana separadas por um rio e depois com o namoro com uma filha, quando comecei a chamar de pai e mãe, sobreviveu ao fim do curto namoro e transformou-se numa relação de pai e filho que se escolheram e que tinham conversas de amigos.

Perdi um amigo.
Chorei por isso, mas não foi apenas apenas triste que fiquei pelo egoísmo de querer que ele estivesse aqui porque eu ainda precisava dele. Fiquei aliviado porque ele não tem mais que viver a vida de uma forma que não estava suportando mais. Ouvi de várias pessoas que estava cada vez mais frequente ele dizer que queria morrer.

Por causa da situação em que ele se encontrava, pensei muitas vezes sobre ficar dependente dos outros para fazer as coisas mais básicas. Eu não quero isso para mim. Eu não queria isso para ele, mas quis saber a opinião de pessoas que vivem situações parecidas com pais e mães em situações ainda piores porque não conseguem mais interagir com eles de forma nenhuma e não havia um consenso. De alguns ouvi que precisavam deles vivos porque sabiam o quanto tinham sofrido com a morte da mãe, por exemplo.
Cada cabeça é um mundo mesmo.

Olhei para ele, com uma expressão que não tinha nada da angústia que ele havia expressado de alguma forma depois da doença. Parecia muito tranquilo e em paz com todas as coisas.
Eu também vou ficar.

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