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quarta-feira, 6 de novembro de 2019

O EXISTENCIALISMO É UM HUMANISMO - JEAN-PAUL SARTRE


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“Eu acredito que o incomoda em meus personagens”, escrevia Sartre, “é sua lucidez. O que eles são, eles o sabem, e decidem sê-lo”.
É esta lucidez seca que também é um sofrimento.
Os cristãos, para além do ateísmo, acusavam Sartre de ser materialista, os comunistas, por não sê-lo;

Por existencialismo, entendemos uma doutrina que torna a vida possível e que, por outro lado, declara que toda verdade e toda ação implicam um meio e uma subjetividade humana. A crítica essencial é que acentuamos o lado ruim da vida humana.
O que amedronta na doutrina é o fato de ela dar uma possibilidade de escolha ao ser humano.
O existencialismo ateu que eu represento é mais coerente. Ele declara que, mesmo que Deus não exista, há ao menos um ser cuja existência precede a essência.
O homem é não apenas como é concebido, mas como ele se quer... o homem nada é além do que ele se faz. Repousa sobre ele a responsabilidade total por sua existência.
Nada pode ser bom para nós sem sê-lo para todos.
Nossa responsabilidade envolve a humanidade como um todo.
Ao escolher a mim, estou escolhendo o homem.
Se uma voz se dirige a mim, sou eu que terei que decidir que esta e a voz do anjo; se eu considero que um ato é bom, sou eu que escolho declará-lo bom e não mau.
E quando falamos de desamparo, expressão cara a Heidegger, queremos dizer apenas que Deus não existe, e devemos assumir todas as consequências disso.
Em 1880, quando professores franceses tentaram constituir uma moral laica, eles disseram mais ou menos o seguinte: Deus é um hipótese inútil e custosa, vamos suprimi-la. Porém, para que exista uma moral, uma sociedade, um mundo que respeite as leis, será necessário que alguns valores sejam levados a sério e considerados existentes a priori.
Dostoievski escrevera: “Se Deus não existisse, tudo seria permitido”.
O home é livre, o homem é liberdade. Por outro lado, se Deus não existe, não encontraremos à nossa disposição valores ou ordens que legitimem nosso comportamento.
O homem está condenado a ser livre. Condenado, pois ele não se criou a si mesmo, e, por outro lado, contudo, é livre, já que uma vez lançado no mundo, é o responsável por tudo que faz.
O existencialista não pensará tampouco que o homem pode encontrar auxilio em algum sinal na terra que o oriente; pois considera que o homem é quem decifra, ele mesmo, o sinal como melhor lhe parecer. O homem, sem nenhum tipo de apoio ou auxílio, está condenado a inventar a cada instante o homem. O homem é o futuro do homem. Isso e perfeitamente exato.
Quem pode ajudá-lo nessa escolha? A doutrina cristã? Não. A doutrina cristã diz: sede caridosos, amai a vosso próximo, sacrificai-vos pelo outro, escolhei o caminho mais exigente etc.
Nenhum código de moral tem resposta para dar. A moral kantiana diz: nunca trate os outros como um meio, mas como fim.
Quando Descartes dizia: “Ganhar-se, antes, a si mesmo que ao mundo”, queria dizer a mesma coisa: agir sem esperança.
O quietismo é a atitude daqueles que dizem: “Os outros podem fazer aquilo que eu não posso”. A doutrina que lhes apresento é exatamente o contrário do quietismo, pois ela afirma: “Só existe realidade na ação“.
Para o existencialista, não existe outro amor do que aquele que se constrói, não há outra possibilidade de amor do que aquela que se manifesta em um amor.
“Você não é outra coisa senão sua vida”.
O existencialista diz que o covarde se faz covarde, e o herói se faz herói. Existe sempre uma possibilidade para o covarde deixar de ser covarde e para o herói deixar de ser herói.
Não existe esperança senão em sua ação, e a única coisa que permite ao homem viver é o ato.
Para que exista uma verdade qualquer, é preciso uma verdade absoluta: e esta é simples, fácil de atingir e consiste em apreender-se sem intermediários.
Todo materialismo tem como efeito tratar todos os homens, inclusive a si mesmo, como objetos.
Nós estamos nos apreendendo a nós mesmos diante do outro...
Descobre também todos os outros, e os descobre como a condição de sua própria existência. Ele se apercebe que não pode ser nada a menos que os outros o reconheçam como tal. Para obter qualquer verdade sobre mim é necessário que eu passe pelo outro.
A escolha é possível em um sentido, mas o que não é possível é não escolher. Eu sempre posso escolher, mas tenho que saber que se não escolho, isso também é uma escolha.
O que há de comum entre a arte e a moral é que, em ambos os casos, temos criação e invenção.
O homem se faz; ele não está feito de antemão. Não definimos o homem senão em relação a um engajamento.
Todo homem que se refugia por trás da desculpa de suas paixões, todo homem que inventa um determinismo, é um homem de má-fé. Não o julgo moralmente, mas defino sua má-fé como um erro. A má-fé é, evidentemente, uma mentira, pois dissimula a total liberdade de engajamento.
Os atos dos homens de boa-fé têm como última significação a busca da liberdade enquanto tal.
Kant declara que a liberdade quer a si mesma e bem como a liberdade dos outros.
Nós pensamos que princípios demasiadamente abstratos não conseguem definir a ação.
Antes de começarmos a viver, a vida, em si, não é nada, mas nos cabe dar-lhe sentido, e o valor da vida não é outra coisa senão esse sentido que escolhemos.
O homem está constantemente fora de si mesmo; é projetando-se e perdendo-se fora de si que ele faz o homem existir.
O existencialismo não é, sobretudo, um ateísmo no sentido de empenhar-se para demonstrar que Deus não existe. Declara, ao contrário, que, mesmo que Deus exista, isso não mudaria nada.
O homem precisa encontrar-se ele próprio e convencer-se de que nada poderá salvá-lo de si mesmo, ainda que houvesse uma prova incontestável da existência de Deus.

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