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sábado, 29 de fevereiro de 2020

VER A MORTE PASSAR PERTO E NÃO LIGAR PARA ISSO

Uma das coisas que fiz em Bonito foi mergulhar no Abismo Anhumas. É uma experiência que, pela aventura que é e o custo que isso envolve, deve ser feita por qualquer um que possa. Talvez seja uma oportunidade única.

Começa pelo acesso 72 metros abaixo do lugar de onde se começa a descida. Uma altura equivalente a um prédio de 26 andares, chegando num deck flutuante. Se você ler o termo de responsabilidade que assina com muito cuidado, pode ser que não se anime a fazer o passeio.

Minha única preocupação era com a luz para as fotos, mas encontrei com um jovem americano, dermatologista em New York, que tinha outras e me disse que para fazer a descida tinha tomado um tranquilizante. 

Todo esforço para subir e descer é manual mas feito pelos funcionários. Não exige nenhum esforço de quem vai para passear. Até fevereiro de 2020 ainda não havia sido instalado o guincho para subida e descida, mas parece que isso vai ser feito agora em março de 2020, já que lá não existe energia elétrica

Lá, quem tem credenciamento para mergulho autônomo, por uma taxa adicional pode mergulhar com cilindro enquanto os outros farão uma flutuação e depois disso todos farão um passeio de bote. 



O lugar é espetacular. Uma enorme caverna com estalactites e estalagmites e cones submersos



No dia que eu fui em fevereiro e considerado como baixa temporada então só desceram 4 pessoas. Um casal que foi para fazer a flutuação e eu e uma chinesa que mora nos Estados Unidos que fomos para o mergulho autônomo. O rapaz que nos acompanhou no mergulho foi extremamente tranquilo e gentil e eu pelo meu lado aprendi que devo ser atencioso com as mulheres, então procurei ficar perto e dar bastante atenção para a chinesinha e fiquei perto para que ela se sentisse tranquila.

Eu estava bem tranquilo e não sou um mergulhador experiente. Vou lembrar de novo que quando fiz o curso de mergulho de ter dito para o instrutor que tinha gostado muito daquilo e que iria fazer sempre e dele ter me dito que eu não iria não, que a maior parte das pessoas faz o curso, o batismo e depois nunca mais mergulha. E não foi diferente comigo. Não mergulhei muito depois do batismo.

Mas acho que eu estava passando tanta tranquilidade que o mergulhador que nos acompanhava me esqueceu e estava de costas para mim quando eu senti que o ar do meu cilindro estava acabando e por fim acabou mesmo. Zerado de ar.

Sinalizei  em círculos com a lanterna, o que significa que estava tendo problemas e quem viu não foi ele mas a Darclyn, a chinesa. Quando ele se virou para mim sinalizei que estava sem ar e ele ainda assim achou que eu estivesse em pânico ou coisa assim e antes de fazer o que deveria, que seria me dar ar do regulador do equipamento dele ele foi verificar o manômetro do meu cilindro para finalmente me dar ar e depois inflar meu colete equilibrador com a boca e irmos até a superfície.

Não tenho a exata noção, mas não estávamos muito abaixo da superfície, porque estávamos perto de uma das extremidades da caverna e quando respirei na superfície  fiquei mais tranquilo e nadamos até o deck. O abismo não é tão grande.

Não fiz daquilo um drama nem precisei ficar falando daquilo, mas o que aconteceu foi muito sério e eu realmente espero que ele tenha tido a dimensão da gravidade do acontecimento para que venha a ter atenção total quando a vida de outras pessoas depende disso.



Quando estava saindo para pegar o carro encontrei o rapaz organizando o material na camionete e ele fez o pedido de que eu não fizesse uma reclamação e que ele gostaria de me dar as fotos subaquáticas como uma forma de expressar suas desculpas com o meu desconforto. 
Foi mais que um desconforto. Foi uma situação muito séria e se eu não fiz barulho com isso é porque eu estou de bem com a vida e, no caso dele, penso que não é um sociopata que não se sente culpado por nada que causa, principalmente se não sofre alguma consequência.

Em Bonito só falei do assunto, três dias depois com a pessoa da minha agência de turismo de lá e pedi a ela para se manter discreta a respeito porque fico pensando que talvez para ele aquilo seja um emprego dos sonhos, numa cidade de interior que talvez só tenha uma operadora de mergulho.

Eu sabia que eu iria escrever sobre o assunto, mas alguém de lá chegar até este relato é outra estória. Acho bem difícil.

Fiquei dividido entre a minha responsabilidade quanto a outras pessoas que poderiam vir a ter um problema desses com o mesmo rapaz e que isso leve a um evento fatal, porque ele não teve consequência desse, ao mesmo tempo que fico pensando em não prejudicá-lo, e que isso tenha servido como uma lição de vida valiosa para ele.

Um dilema ético na verdade, porque não perdi o controle da situação, nem me apavorei, mas que poderia ter morrido nessa situação, isso é um fato. 

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